O Tejo mexe-se calmamente e a primeira claridade ilumina o cais.
A madrugada assombra a noite e pinta a atmosfera de um cinzento azulado, cada vez mais claro que se mistura com a luz alaranjada dos candeeiros. A maresia inunda a praça, a avenida, entra nos pulmões intoxicados do ar concentrado de fumo e tabaco da discoteca e faz um contraste entre a acalmia do agora e a embriaguez do antes, que parece já tão longíquo apesar de ter sido à instantes.
O cigarro esvai-se entre os dedos passivos e a cada nova nuvem de fumo, pensamentos condensam e fermentam, ferem o espaço vazio. Os lábios quentes arqueados num anel turvo que se desfaz no tempo e em mim. A quieta indefinição perfilando-se no momento do nascer de um novo dia, no instante em que as vibrações das músicas ouvidas entoam na imaginação. A maré do Tejo embala-me na necessidade de uma presença no meio deste frio de quem espera num permissivo suspiro.
Olho para o lado e volto à realidade. Sorrio-te ao de leve, nem sei se reparas. Sei que esperas ainda agora por algo mais, por um momento que se quer mais próximo, mais quente, mais de nós.
Volto de novo os olhos ao Tejo e fecho-os por apenas um segundo. Mais do que o desejo de um outro lugar, de outras temperaturas e vivências, a verdade é que já sonho a acalmia do meu cansaço, a maré de quietude que só vem com o passar dos ponteiros do relógio... os segundos decrescentes para o salto no abismo pelo qual desespero... a ânsia de me deitar, de relaxar os músculos finalmente, libertá-los da tensão do alcool e do movimento, fechar os olhos e cair suavemente no embalar do sono tranquilo.
Apago o cigarro na pedra em que me sento, neste cais de cidade semi acordada, semi dormente. Está na hora de ir embora, e todos combatemos o ar gélido que nos rodeia e levantamo-nos, caminhando para londe do Tejo.
Despeço-me com um olhar, como quem se despede de um amante antigo mas sempre presente.
Parting is such a sweet sorrow that I'll shall say goodbye till it be tomorrow.
Está na hora de ir para o aconchego de uma cama.
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